Monday, June 25, 2007

Constitucionalistas em Atenas




Constitucionalistas de todo o Mundo reuniram-se em Congresso. Decorreu no forum Zappeion Megaron, em Atenas, edifício ao gosto clássico, elegante e inspirador.
David Lodge, autor da novela académica Small World, detectou todos as subtilezas dos congressos científicos internacionais. E com base nesse livro, verdadeiro clássico, transmitiu já a TV uma memorável série. Para quando a retransmissão?
Mas importa distinguir. Os congressos significam normalmente muito labor e criatividade. Longe de serem só (como a caricatura no-los mostra) hipocrisia, vaidade inflamada, affairs, e mistificação pseudo-científica.
Tenho participado em fora que se preparam durante longos meses ou anos, com intervenções que se nutrem de aturada investigação e sábia meditação, redigidas com rigor e vertidas em línguas estrangeiras, implicando prévia troca de ideias, experiências, informações e bibliografias, etc. Uma vez reunidos, os estudiosos podem, assim, informada e de forma esclarecida, trocar e aprofundar ideias em diálogo presencial (que jamais as novas tecnologias substituirão cabalmente), conhecer novos colegas e rasgar novos horizontes.
Tive a honra de, por incumbência da Associação Portuguesa de Direito Constitucional, ter coordenado a delegação portuguesa e representado Portugal (acompanhado pelo Prof. Leite Pinto) no Conselho da Associação Internacional de Direito Constitucional.

As temáticas foram interpelantes. Nas sessões plenárias: a Constituição entre conflito e estabilidade; religião, Estado e sociedade; e a internacionalização do Direito Constitucional (esta com alocuções de Juízes de Tribunais Constitucionais); assim como as respostas filosóficas às ameaças (desde logo derivadas do terrorismo) ao constitucionalismo. Aqui pontificou o Prof. Dworkin.
Sessões especializadas dedicaram-se ao envolvimento popular na feitura das Constituições, à interpretação constitucional e à proporcionalidade, às emergências constitucionais (sessão presidida pelo Prof. Vergottini), às constituições infranacionais, aos sistemas eleitorais, ao controlo jurisdicional das questões políticas sensíveis, aos mecanismos constitucionais úteis à resolução dos conflitos internos, e à teoria constitucional recente. Outros grupos trataram dos desafios às Constituições postos pelo terrorismo, as privatizações, a laicidade, a corrupção e a momentosa problemática da Constituição Europeia.
Os constitucionalistas portugueses falaram sobre o neorepublicanismo (Prof. Leite Pinto) e sobre os limites das revisões constitucionais. Fomos escutados com muito interesse, e suscitaram-se diálogos de grande nível.
Denunciei o contra-senso de uma Constituição flexível escrita - saco vazio em que tudo pode ser metido e tirado - , defendendo outrossim limites de revisão compatíveis com a constituição material, a que é sentida pelo Povo como sua (reconhecendo que tal não é fácil de avaliar). A convite do Presidente da sessão, Prof. Claude Klein, na alocução oral referi-me ainda à génese, conteúdo e sentido dos limites explícitos de revisão constitucional, assim como à dupla revisão de que já foram alvo.
Pelo acolhimento caloroso, sentimos vivo o interesse pelo nosso País, pelo que aqui se faz e pensa, e uma grande admiração pela nossa Constituição, que infelizmente alguns, mais papistas que o Papa, gostam de caluniar, às vezes até como estrangeirada. De novo se verificou que a nossa Constituição e a qualidade dos nossos constitucionalistas é um cartão de visita lá fora, e uma marca nossa, a preservar e a acarinhar. Reiterado ficou o nosso prestígio, v.g. pelas manifestações de apreço pelo Conselheiro Prof. Cardoso da Costa, por quem continuamos envolvidos ao mais alto nível na Associação, agora presidida pelo Conselheiro de Estado francês Prof. Didier Mauss, com que tivemos frutuosa reunião de trabalho.
De assinalar especialmente (sem prejuízo de outras pontes e laços) a grande comunhão de vistas do mundo lusófono (estavam presentes mais de uma dezena de brasileiros, entre os quais o emérito Prof. Manoel Gonçalves Ferreira Filho) e mediterrânico. Aqui também se viveu, em grande amizade e intercâmbio frutuoso, a Pátria comum que é a Língua, e o lago que foi romano e de que somos última extensão ocidental. A propósito: CPLP jurídica, para quando? E a sonhada União Mediterrânica?
Mas a educação não acompanha a ciência: Chegado, soube do esfaqueamento de um amigo, Professor de Direito, por um estudante! Até onde não subiremos? Até onde não desceremos?

PFC in "O Primeiro de Janeiro"

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